A resistência dos surdos à educação inclusiva e a defesa da escola especial contrapondo-se ao exposto na Portaria do MEC nº 555/2007, uma "Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva" deram a tônica ao evento realizado na Ordem dos Advogados do Brasil - Secção de São Paulo, no dia 13/2, um importante debate sobre a educação de pessoas com deficiência.
Foi promovido pela Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência, deixando clara a posição antagônica de ambos: de um lado, a portaria defendendo a presença dos alunos com deficiência no ensino comum, com atenção às características individuais e apoio do ensino especial; e de outro, os representantes da comunidade surda defendendo a permanência das classes ou escolas exclusivas, fora do ensino comum. Contou com a participação de pessoas com reconhecida e longa atuação na área da deficiência: Neivaldo Zovico, Diretor Regional da Feneis/SP - Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos; Paulo Vieira, assessor da presidência da Associação dos Surdos-SP; Prof. Dra. Linamara Rizzo Battistella, médica fisiatra, Diretora Executiva da Divisão de Medicina de Reabilitação do HC FMUSP e professora do Departamento de Medicina Legal, Ética Médica, Medicina Social e do Trabalho da FMUSP; Dra. Maria Tereza Eglér Mantoan, pedagoga, especialista em educação de alunos com deficiência mental e doutora em Educação na área de Psicologia Educacional pela Unicamp-SP; e Dra. Eugênia Augusta Gonzaga Fávero, Procuradora da República junto ao Ministério Público Federal e mestre em Direito Constitucional.Dra. Mantoan, colaboradora do MEC neste trabalho, defendeu que "não é possível parar no tempo, é preciso avançar, reconhecendo o importante papel do ensino especial para a educação inclusiva". Ela deixa claro que o primeiro deve ser apenas uma modalidade da segunda. "É necessário que a educação especial esteja a serviço da educação inclusiva para garantir o direito às diferenças e combater a segregação".Dra. Linamara destacou que o termo "segregação" pode ser definido como "opressão" e o indivíduo deve ter preservado o seu direito à cidadania, que pode ser definido como sentimento de "pertencer", só desenvolvido quando assegurado o direito de escolha e do conhecimento. "Precisamos libertar o cidadão, pois este encontra na escola mais que uma instituição de ensino, um espaço de socialização, sua função por excelência", destacou.
Com seu conhecimento médico em desenvolvimento humano e reabilitação, acrescentou que a inclusão educacional necessariamente deve se dar na primeira infância, de 0 a sete anos. "Após isso será um arremedo de inclusão", frisou. Outro destaque importante foi sua constatação de que a educação especial é um paradoxo e não atingiu seu objetivo, pois se tivesse atingido não haveria hoje o cenário de segregação e exclusão de tantos adultos com deficiência. "Porém, a educação especial reúne metodologia e conhecimentos importantes para subsidiar a nova etapa que temos que experimentar e avançar: uma escola única, inclusiva, aberta a todos", ressaltou.
Para Dra. Eugênia Fávero, a legislação vigente é categórica: educação só por meio da educação inclusiva. "A Convenção da ONU pelos Direitos das Pessoas com Deficiência é clara: não há educação fora do sistema educacional inclusivo, garantidos apoios, adaptações e atendimentos especializados". Também destacou que o país se tornou bilíngüe, quando aprovou a lei nº 10.436, oficializando o uso da Libras - Língua Brasileira de Sinais - como uma segunda língua oficial. "Nenhum outro idioma foi oficializado em lei em nosso país", afirmou.
Apesar da apresentação dos benefícios e defesa da educação inclusiva, pelas doutoras, Neivaldo Zovico e Paulo Vieira, representantes da comunidade surda, destacaram que não há incentivo necessário para que crianças surdas detenham aprendizado no ensino comum e que o oralismo não deve ser imposto aos surdos, que devem ter suas especificidades respeitadas. Zovico destacou que, sendo professor de matemática, só enxergava possibilidades de ensino nas escolas especiais. Este argumento foi rebatido pela profª Mantoan que ressaltou faltarem professores em Libras nas diversas áreas do saber.
Ao final do evento, permaneceu a impressão de que os surdos querem ser reconhecidos e respeitados pela sua deficiência - a surdez - uma postura antagônica ao movimento da inclusão social que quer destacar o indivíduo, a pessoa, à frente de sua deficiência, qualquer que seja, e assegurar os mesmos espaços - educacionais, profissionais e sociais - a todas as pessoas, independentemente de sua condição física, intelectual, auditiva ou visual.
Maria Isabel da Silva - JornalistaCentro de Comunicação Institucional DMR HC FMUSP